Um cheiro de café acorda o Joahkiin.
Não era o café frio no chão de sua jaula... Era café fresco... Quente... Um aroma que tomava todo o ambiente, e não seu faro apurado buscando seu ópio do lado de fora da cela na torre da prefeitura de Beagá. Por isso, ele decide abrir os olhos.
Pensara cego por uma fração de segundos. Estava numa sala azul iluminada irregular como se fosse uma curva num corredor longínquo, e não mais na masmorra escura da prefeitura de Beagá. Com o tempo, sua visão se acostuma com a claridade. Estava no centro de uma sala circular, dentro de um pentagrama azul. Não havia grades... Não havia a prefeita... Havia apenas uma caneca de vidro transparente e seu conteúdo fumegante: café.
- Beba... – uma voz diz. O Farendalf acreditou que foi a sua própria, mas não era... Não importava. Era seu vício apresentado na forma mais límpida e pura. Lágrimas escorreram do Jão.
Ele hesita. O calor radiava da caneca de vidro até sua mão poucos centímetros. Mas enfim, sem cerimônia, ele apanha-a, não pela asa, mas pelo corpo.
O primeiro gole queima a língua. Era quente e doce. Seu paladar estava prejudicado, mas mesmo assim ele verteu suavemente aquele líquido. Terminou com uma golada satisfatória. Baixou a caneca, ergueu a fronte e permitiu-se respirar um ar límpido, sem o mofo e a umidade da cela.
- Está feito... – A mesma voz de antes falou. Jão não mais achava que era sua própria. Parecia no começo duas pessoas, mas logo, era uma voz límpida, mas ecoada como se fosse uma multidão.
O salão começou a ser iluminado de forma diferente... Uma luz azul bruxuleante alterava as tonalidades de azul. Farendalf fita as lâmpadas do teto... Não eram elas a fonte da perturbação da luz...
... Era seu próprio corpo!
- A Magia despertou. – fala a voz ecoada. – Joahkiin, mago da Ordem antiga, portador do título de Farendalf, sua herança está entregue.
- C... Como assim?!? – palavras coesas saem da boca do Jão pela primeira vez em seis meses.
- Você é um coração puro que sofreu uma grande injustiça. Os Deuses se identificaram com seu sofrimento, e decidiram te libertar. Estenda a sua mão.
Farendalf começa a erguer o braço.
- Não! – censura a/as voz/ses. - Ponha sua energia no movimento! Deixe que seu instinto guiar o poder ancestral!
Farendalf faz o movimento solicitado com vigor. Percebe então uma energia azul correr como chamas e raios por seu corpo, detendo-se na mão, e erguendo uma forma circular imediatamente à sua frente.
- Este é seu BLOCK. – fala as vozes. – Com isto, ninguém mais poderá lhe fazer mal.
- Que legal! – Jão sorria tão forte que sentia doer seu maxilar. – E poderes ofensivos? Eu tenho?
As vozes silenciam alguns segundos, mas enfim começam.
- Esta é a magia verdadeira, Farendalf. Não a prestidigitação do basílico Mago. – havia um tom de repreender. – Sim, você tem poderes ofensivos, mas devem ser usados com cautela e sabedoria.
Farendalf imagina uma esfera daquela energia azulada e estende sua mão em arco. Uma onda daquele poder projeta-se vários metros além de seu corpo, atingindo a parede e se dispersando.A língua de Jão corre por sua boca.
- O que mais eu tenho?!? – a euforia estava tomando conta dele.
- Assim que sair deste bolsão dimensional, você poderá ... Voar...
Tudo fazia sentido na mente de Joahkiin. Ele começa a caminhar pelo salão curvo. Logo sente ar fresco, e vê numa lateral antes da última curva, um portal. A luz que saia de lá era inegavelmente a luz da lua. Não más numa janela distante no alto da masmorra, mas na porta.
Mas algo chama a atenção do mago. Um pequeno volume à sua frente.
- O que é isso, Vozes?
- Este é um boneco Vodoo de seu inimigo.
Com a explicação, a imagem passa a fazer sentido. Era uma forma inumana... Primata... Com runas verdes nas juntas. Era uma representação de chimpanzé. E aos seus pés, uma adaga de lâmina curta.
- E é para fazer o que? – pergunta o poderoso mago azul.
- Deve ignora-lo. – falam as vozes. – Estamos confiando a você grandes poderes para proteger os fracos e inocentes do mundo, não para seu orgulho. O artefato à sua frente funciona. Todo o mal feito ao receptáculo será sentido pelo alvo. Mas se o fizer, não lhe devolveremos a sua liberdade, e lhe tomaremos seus poderes. Pense bem sobre suas ações...
Jão saliva pensando em ter sua vingança imediatamente. Mas isso lhe privaria de poderes. A escolha era óbvia! Deveria ser um bastião de bondade. Para o Bem vencer, ele precisaria ignorar seus sentimentos mesquinhos e se elevar como um campeão da justiça.
Ele passa pelo boneco, e sente sua aura ampliar. Seu poder crepitar de forma que não pensava ser possível. A um passo da saída, sentia-se um deus.
Então, ele hesita. Por três... Cinco segundos...
... Dá um berro inumano...
E vira-se de costas para a entrada.
Ele salta sobre o artefato como um tigre à sua presa. Com destreza, ele agarra o cabo do punhal, e começa a apunhalar freneticamente o boneco. O primeiro foi no coração, o segundo no cérebro... Incontáveis outros alternavam entre a virilha e o cu.
A luz diminui de repente. Uma porta de madeira surge na passagem fechando-a... O Arrependimento brota em Joahkiin deixando suas mãos trêmulas.
- Que pena... – fala uma Vaz vozes que ele ouvia. Não mais parte de uma multidão, mas uma voz singular ligeiramente sobre efeito de eco. Uma voz feminina. – Queria muito que você tivesse atravessado a porta e visto que era sua cela.
- Cela?
A Prefeita de Beagá aparece. Estende a mão para tocar o rosto de Farendalf. Traumatizado, o mago faz o gesto e conjura seu “Block”. A mão da Bruna atravessa o petardo como um fantasma e alisa a bochecha de jaó, que salta para traz dois metros.
- Não existe Block. - fala outra voz. Jão reconhece como uma das que falavam com ele, mas era masculina desta vez, embora aguda. – Você teve uma dose de café que seu corpo não estava acostumado após meses de confinamento. Você estava alucinando o tempo todo, e nós íamos moldando o que você via.
Com a revelação Farendalf percebe que as supostas luzes eram um produto de sua mente. Quanto mais entendia o que eram, menor críveis seus “poderes” pareciam. Jão estava em choque, contudo, pode sentir algo pastoso em suas mãos... O que fizera. Sem a ilusão, percebe que o macaco Vodoo que via em sua mente era um macaquinho de pelúcia. E ele “apunhalara” o coitado com uma banana madura a ponto de se tornar creme.
Dois guardas da milícia de Beagá surgem da mesma esquina em que Bruna se escondeu e caminham na direção de Joahkiin. – Devolva-o à cela. – fala a prefeita. – E corte sua ração. Ele tomou café por uma semana inteira agora a pouco.
Jão tenta lançar seus raios, mas nem mesmo ele acreditava mais nos delírios. Ergue a mão para novo Block, mas nem enxergava o escudo arcano. Os bandidos o agarram sem cerimônia e o arrastam. O macaquinho e a banana caem no chão quase aos pés de Bruna. Passam pelo outro que a ajudou neste cruel trote, e em pouco tempo, Farendalf voltaria à cela em que os basílicos o deixaram.
- A dose extra de cafeína não faria tudo isso sozinha. – confirma Bruna.- Foi você, não? Você quem tornou a prisão de Joahkiin ainda mais penosa por dar este breve instante de poder, liberdade e vingança?
O acompanhante sorri com orgulho de seu feito mesquinho e abruma sua túnica.
- Resuma isso tudo que Farendalf percebeu como “Esperança”. – fala enfim. – Quando Pandora abriu a caixa e espalhou as mazelas pelo mundo, ela tentou fechar novamente, aprisionando a Esperança nela. Por que você acha que a Esperança estava na caixa das mazelas do mundo? Ela é um mal também. Pela Esperança os Basílicos tentam prosperar neste mundo destruído. Pela Esperança eles acreditam uns nos outros... E em seus líderes.
- Então esta é sua origem? – bruna ri com malícia. – É da Caixa de Pandora que você nasceu,Basílico Desgraça?
O pretor sorrir com maldade. Ele acena positivamente. Sabia que deveria ter vergonha por ser um traidor corrupto da Basílica, um judas que estava traindo seus integrantes e torturando-os com seu poder. Mas era isso que o fazia ser o Desgraça.